terça-feira, 18 de janeiro de 2011

FUNDAMENTOS PARA UMA FILOSOFIA DOS BARES

Em tempos de individualismo exacerbado, de crise intelectual e da mesquinhez das relações sociais prefere-se as discussões rasas, os assuntos órfãos que se abandonam e se adotam ao acaso. É a economia dos neurônios. Um sujeito sábio quando sentado em uma mesa em que prevalecem pessoas ignorantes será sempre tão ignorante quando um ignorante sentado em uma mesa em que prevalecem pessoas sábias. Os espíritos de hoje se furtam de maiores esforços e saltos demasiado largos em questões relevantes, afora os pedantes. É a economia do pensar. 
É contra essa economia que vos digo, e vos digo também que devemos estar sempre prontos a ouvir com interesse o que o outro sentado na mesa do lado tem para nos dizer. Temos em nossos bares gentes diversas de vivências diversas, que seguem sistemas filosóficos próprios os quais valem muito serem apreciados. Destes filósofos empiristas, que em nossos bares muitos frequentam, cada qual nos ilumina para nobres valores e nos repele a outros tantos que não são tão nobres assim. Claro, nem tudo é perfeito e devemos ter discernimento, afinal. Um dos mais emblemáticos boêmios da história e filósofo dos bares nos legou essas sábias palavras:

[...] em sociedade deve [-se] prestar atenção a tudo, [...] os primeiros lugares são muitas vezes ocupados pelos menos capazes e o bafejo da sorte quase nunca atinge os competentes. [...] não raro, enquanto conversam à cabeceira da mesa acerca da beleza de uma tapeçaria ou do sabor da malvasia, bons ditos se perdem do outro lado. Terá de sondar o valor de cada um: boiadeiro, pedreiro ou viandante. Cada qual em seu domínio pode revelar-nos coisas interessantes e tudo é útil para nosso governo." (MONTAIGNE. Ensaios I. Cap. XXVI. p. 83. 1580)

Montaigne, boêmio do séc. XVI, resume acima de forma belíssima o espírito filosófico fundamental que deve fazer parte de uma filosofia dos bares. 

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